Síndrome de Erdogan: quanto custaria ao Brasil romper com os mercados?
Talvez como reflexo natural do debate político, o debate econômico no Brasil tem esquentado — e também como no debate político, não tem havido espaço para nuances. Para Lula e vários dos seus aliados, os termos são os da luta de classes: de um lado, os pobres, assalariados e seus ditos representantes políticos; do outro, os empresários, os rentistas e os ideólogos neoliberais. Estes são culpados por todo o conjunto de problemas econômicos que assolam o País: inflação, juros altos, empregos precários, crescimento estagnado, desigualdade. Nesses termos, é hora de imaginarmos o que separa o Éden heterodoxo das restrições do mundo real. Quem propõe um rompimento com a subordinação atual das finanças públicas aos mercados financeiros globais precisa começar a responder como lidar com o que seguiria a esse rompimento. Comecemos pelas taxas de juros. Na semana passada, Lula sugeriu que parte da culpa pela inflação alta deve ser colocada nos juros altos – tal qual como seu par turco, Recep Erdogan, já faz há anos. No auge do seu arroubo retórico, o Presidente nos convidou a sonhar: “A gente poderia não ter nem juro…” Bem, afastando-se essa impossibilidade, como produzir uma queda forçada nos juros? Primeiro, seria preciso revogar a autonomia do Banco Central, hoje garantida por lei – talvez forçando a maioria da atual diretoria a renunciar. Vencido este inconveniente, bastaria colocar a taxa Selic próxima a zero e – voilà! – estaríamos na trilha do desenvolvimento. Mas no meio do caminho, haveria a reação dos mercados. Cerca de 9,5% do estoque dos títulos da dívida interna – pouco mais de R$ 530 bilhões – são hoje detidos por investidores estrangeiros, que recebem o que julgam ser uma remuneração atrativa para deixar no Brasil parte do dinheiro que administram. Se, digamos, metade desse dinheiro acreditar que há melhores opções no mundo a receber, no futuro, reais sem correção de juros, estaríamos falando de uma saída de mais de US$ 100 bilhões – mais de dois anos do saldo comercial projetado pelo Banco Central para este ano e um terço do estoque de reservas internacionais. Parece improvável que uma demanda por trocar reais por US$ 100 bilhões não mexa com a taxa de câmbio. Mas aqui, o governo heterodoxo também pode fazer escolhas: deixar o mercado encontrar a taxa de câmbio que equilibra essa nova demanda com a oferta de dólares no país (incluindo a disposição do BC de se desfazer de reservas – mas a que preço?) ou aproveitar para também implementar medidas de controle de capitais, impedindo que o dinheiro deixe o país apressadamente e o real se desvalorize. Qualquer que seja a solução encontrada para os fluxos imediatos, por mais bem sucedida que seja, levará a uma mudança de preço para os fluxos futuros. Quem for colocar dólares no País para receber no futuro pedirá uma remuneração maior pelo risco de não receber seu dinheiro quando quiser, para não falar da incerteza sobre a tax